domingo, 14 de março de 2010

'IstoÉ': 71 telefonemas ligam Pimentel a Marcos Valério e ao mensalão do PT


Documentos inéditos guardados no cofre do Congresso Nacional podem desmontar definitivamente a versão petista de que não passa de pura ilação do Ministério Público Federal o envolvimento de Fernando Pimentel, coordenador da campanha presidencial da ministra Dilma Rousseff, com o Mensalão do PT. Extratos da quebra de sigilo telefônico levantados pela CPI dos Correios indicam as ligações entre Pimentel, ex-prefeito de Belo Horizonte, e o publicitário Marcos Valério, um dos principais protagonistas do esquema de caixa 2 petista usado para a compra de apoio político no Parlamento.

Depois que ISTOÉ divulgou o conteúdo do processo do Mensalão, que corre no Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-relator de movimentação financeira da CPI, deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR), recorreu aos arquivos que ficaram nos notebooks dos parlamentares da CPI e descobriu ligações telefônicas de Valério para o gabinete de Pimentel na Prefeitura de Belo Horizonte. Na época, de acordo com o deputado, esses telefonemas não mereceram maior atenção mas, diante das revelações que estão no processo do STF, eles serão novamente analisados. “A quebra de sigilo feita pela CPI mostra que há uma relação direta de Marcos Valério com Fernando Pimentel e com a Câmara de Diretores Lojistas de BH (CDL), que fechou contratos com o prefeito”, acusa Fruet. “Vamos pedir acesso a todo o banco de dados da CPI dos Correios para aprofundar a investigação”, afirmou Fruet na quarta- feira 10, pouco antes de se dirigir ao gabinete do senador José Sarney (PMDB-AP) para solicitar toda documentação guardada nos arquivos.


INQUÉRITO
Segundo o promotor Barbabela, a CDL apresentou nota falsa de R$ 1,16 milhão à prefeitura

Em suas buscas iniciais, Fruet constatou cinco ligações disparadas da SMP&B, agência de Marcos Valério, para a Prefeitura de Belo Horizonte, no início de 2004. Três delas foram feitas diretamente para o gabinete do prefeito da capital mineira. Coincidência ou não, foi também no início de 2004 que Pimentel firmou convênio sem licitação com o diretor da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), Glauco Diniz Duarte, dono da GD International e da Gedex International Corporation, empresas que, segundo o Ministério Público Federal, transferiram dinheiro do Brasil para o BAC Florida Bank e de lá irrigavam a conta da empresa Dusseldorf, no Bank Boston das Bahamas, que pertence ao publicitário Duda Mendonça, responsável pelas campanhas do presidente Lula e do prefeito Pimentel.

O contrato do projeto Olho Vivo, para instalar câmaras de vigilância em BH, foi superfaturado em mais de R$ 2 milhões, exatamente o valor que Duda recebeu no Exterior, a partir do esquema mineiro. Ao todo, Duda recebeu R$ 10,4 milhões do PT na conta Dusseldorf. Os registros já localizados por Fruet apontam que no mesmo período em que Pimentel fechava contratos com Diniz a CDL efetuava dezenas de ligações para as empresas de Valério. O deputado já rastreou pelo menos 57 telefonemas da SMP&B para a CDL. Da sede da DNA Publicidade, também de Valério, foram feitas outras nove chamadas para a CDL. “As ligações telefônicas mostram que Marcos Valério estava ligado às duas pontas do esquema fraudulento, à CDL e ao prefeito”, afirma Fruet.

Também chamou a atenção do parlamentar o fato de que os telefonemas foram feitos para o gabinete do prefeito e não para a área de comunicações da prefeitura, como seria o trânsito normal a ser percorrido por uma agência de publicidade. A abertura dos arquivos da CPI dos Correios, diz Fruet, poderá esclarecer outras ramificações do esquema. No banco de dados, há informações dos extratos bancários da SMP&B, mostrando que a empresa de Valério recebeu pagamentos da CDL entre 2002 e 2003, antes da assinatura do convênio com Pimentel, no início de 2004. Principal protagonista dos Mensalões do PT e do PSDB mineiro, Valério, por intermédio de assessores, disse à ISTOÉ que não estava envolvido com a gestão de Pimentel, mas não explicou as ligações telefônicas já comprovadas. “Não conheço Fernando Pimentel”, disse Valério.

O promotor Leonardo Barbabela, do Ministério Público de Minas Gerais, concluiu que o contrato de Pimentel com a CDL apresenta vários tipos de irregularidades, como a falta de licitação e até nota fiscal fraudada de R$ 1,16 milhão. No inquérito que tramita em BH e deverá render uma ação por improbidade contra Pimentel, há documentos oficiais mostrando que a empresa M.F. Comercial Distribuidora de Produtos de Informática Ltda., de São Paulo, é fantasma. Foi com o nome dessa empresa que se emitiu nota fiscal falsa para a CDL, a fim de justificar o desvio de dinheiro da prefeitura na gestão Pimentel. No inquérito, o MP investiga estelionato, contrabando, falsidade ideológica, lavagem de dinheiro, crime contra o sistema financeiro nacional e formação de quadrilha. Além do projeto Olho Vivo, fechado com a CDL, o empresário Glauco Diniz ainda ganhou espaços publicitários na administração de Pimentel.

Esses outros contratos também serão investigados. Outros personagens envolvidos na investigação negam ter participação no esquema. O doleiro Camilo de Lélis Assunção, por exemplo, é citado no processo movido pelo Ministério Público Federal de Minas contra Glauco Diniz e o contador Alexandre Vianna de Aguilar, por envio de dinheiro para o Exterior. Segundo o MPF, Camilo de Lélis tem envolvimento com o esquema de pagamento de Duda. “Fui chamado à 4ª Vara da Justiça Federal para prestar esclarecimentos em um processo sigiloso, mas não tenho nada a ver com isso”, diz Camilo de Lélis. Mas os parlamentares que decidiram reabrir os documentos da CPI dos Correios duvidam da inocência dos envolvidos, principalmente de Pimentel. “Com essas ligações do Valério para o gabinete do prefeito, o cerco está se fechando.

Diante das novas evidências, o Ministério Público deve pedir a base de dados da CPI e fazer o aditamento da denúncia, incluindo o Pimentel”, diz o presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Demóstenes Torres (DEM-GO). “São fatos novos, desconhecidos até pelo MPF. Não tenho dúvida que fica bem efetiva essa relação do Pimentel com o esquema do Mensalão”.

PROTEGIDOS
Dilma com Pimentel




Oficialmente, o PT procura minimizar o envolvimento do coordenador da campanha de Dilma Rousseff, Fernando Pimentel, com o esquema do Mensalão. Líderes do partido, como o presidente José Eduardo Dutra, afirmam que os documentos anexados ao processo do STF são apenas ilações e que tudo não passa de “intriga” de opositores. “Não existe envolvimento do Pimentel com o Mensalão”, diz Dutra. “A acusação do Ministério Público não tem pé nem cabeça”, completa. No entanto, nos bastidores, os petistas não descartam a possibilidade de que o ex-prefeito venha a se afastar da campanha, a fim de não contaminar a candidatura de Dilma, como teme o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “O Pimentel está preocupado com tudo isso”, disse à ISTOÉ um dos fundadores do PT em Minas Gerais e antigo confidente do ex-prefeito. “Ele sabe que pode ser enquadrado em ação na Justiça e que isso poderá provocar um estrago.” A preocupação de Pimentel é reforçada pelo fato de vários petistas históricos não estarem se empenhando na sua defesa. Presidente do PT na época em que o partido operou o Mensalão com Marcos Valério, o deputado José Genoino (SP) lava as mãos sobre as acusações que envolvem Pimentel com o esquema. “Não vou opinar sobre coisa que não me diz respeito”, disse Genoino à ISTOÉ. O deputado Ricardo Berzoini (SP) também preferiu se calar. “Não dou opinião.

Não conheço o inquérito. Não conheço a denúncia. Não vou falar sobre fatos que ainda não ocorreram”, afirmou Berzoini. Ministro- chefe da Casa Civil no período do Mensalão e acusado de ser o principal mentor do esquema, o deputado cassado José Dirceu também é sucinto ao tratar do assunto: “Não falo sobre isso. É uma ilação sem sentido.” Menos atrelado às conveniências de seu partido, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP), mesmo alijado na disputa para ser o candidato a governador de São Paulo, é um dos poucos solidários a Pimentel. “Eu conheço o Pimentel e sempre tive dele uma impressão de seriedade no trato da coisa pública. Eu fi caria muito surpreso se ele tivesse um procedimento inadequado”, disse Suplicy. Os políticos do PT, em sua maioria, evitam falar abertamente sobre a permanência de Pimentel. A exceção fi ca por conta dos políticos fi éis a ele em Belo Horizonte. Para o presidente do PT mineiro, deputado Reginaldo Lopes, nada vai atrapalhar os planos eleitorais do partido de lançar Pimentel ao governo de Minas, embora isso não esteja nos planos de Dilma ou de Lula. “O PT vai chegar em abril com um único candidato. E eu apoio o Pimentel”, diz Lopes. Seu vaticínio, porém, está nas mãos da Justiça.

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